Texto de autor desconhecido

"A riqueza não é necessariamente um cobertor pequeno que para cobrir uns obriga a destapar os outros. Se houver crescimento económico todos poderão cobrir-se sem que ninguém fique exposto ao frio. Sobretudo se esse crescimento económico contornar a escassez de matérias-primas recorrendo à reciclagem. Para além disso, não se pode confundir dinheiro com riqueza. A riqueza é aquilo que se gera à medida que o dinheiro circula: o somatório de todos os bens e serviços que vão sendo produzidos na esteira da transacções económicas veiculadas pela moeda. Por mais artifícios financeiros que se engendrem, na sua essência a moeda é somente um suporte simbólico da capacidade de adquirir bens e serviços. Permita-me que simplifique, perdoando-me um possível excesso de simplismo. Fulano compra a Beltrano, sapateiro, umas botas por dez euros. Beltrano pega nesses dez euros e compra a Sicrano, cozinheiro, um cozido à portuguesa. Sicrano gasta esses dez euros comprando a Mengano, alfaite, uma camisa. Mengano usa os dez euros que facturou adquirindo a Fulano, carpinteiro, uma cadeira. Resultado: uma só nota de dez euros, circulando, deixou atrás de si a geração de quarenta euros de riqueza. Se imprimirmos mais papel-moeda não teremos mais riqueza: teremos meramente mais inflação, os preços aumentam e as possibilidades de consumir mantêm-se nos mesmo níveis. Em certas ocasiões históricas nem foi preciso imprimir papel-moeda: quando os conquistadores espanhóis começaram a explorar as minas de Potosí, a Europa ficou inundada de moedas e a inflação tornou-se galopante. Se a produtividade aumentar e a quantidade de moeda se mantiver, aí aumenta a riqueza. Se Fulano, Beltrano, Sicrano e Mengano aumentarem a sua produção anual de cadeiras, sapatos, cozidos e camisas, a riqueza aumenta mesmo que continue a circular somente a mesma nota de dez euros; os preços descem e todos podem consumir mais. No Ocidente, a produtividade manteve-se praticamente constante durante o longo período entre a Antiguidade Clássica e Revolução Industrial. Ora, quando a produtividade não aumenta, a repartição do consumo entre os cidadãos é sempre um jogo de soma zero: para uns consumirem mais, os outros terão necessariamente de consumir menos. Numa economia pré-industrial o enriquecimento individual a larga escala faz-se à custa do empobrecimento alheio. O mesmo é válido para uma economia moderna cujo crescimento haja estagnado: por exemplo, talvez por viver em Portugal ocorre-me pensar que quando o sector bancário aumenta os seus lucros a 80% num ano, tendo a economia crescido somente 0.5%, é evidente riqueza está a ser transferida de umas mãos para as outras; uns enriquecem e outros empobrecem. Quid juris?
Desde a Revolução Industrial que as economias desenvolvidas vão crescendo. O dinheiro compra cada vez mais bens e serviços. Todos poderemos ser ricos. Todos? Nem todos. Se houver uma manipulação política pouco equânime da atmosfera económica, a conquista de riqueza pode desligar-se do mérito produtivo e tornar-se o mero resultado da cativação de rendas criadas por decisores político-administrativos, as quais permitem o enriquecimento sem produção de bens ou serviços. É o caso quando alguém enriquece às custas de possuir um alvará para explorar em exclusivo recursos naturais escassos e de alto valor de mercado, ganhando uma renda por eles: os combustíveis, o solo urbanizável, o solo agrícola, as nascentes de água, os recursos minerais, os canais de rádiodifusão (p.ex., as licenças de operador televisivo ou de telecomunicações), os bancos de pesca, &c, &c. Os Sauditas, por exemplo, vivem das rendas do petróleo: foi a Natureza a produzi-lo, são as petrolíferas ocidentais a extraí-lo e a refiná-lo, mas a riqueza do petróleo em si, que deveria ser uma dádiva de toda a Humanidade, é gasta em palácios para os emires e sultões. Entre nós, Portugueses, há enormes sectores da sociedade a viverem de rendas causadas por alvarás outras formas político- administrativas de inflacionar artificialmente os rendimentos: desde logo os loteadores de terrenos, mas também as operadoras de telecomunicações, as explorações agrícolas isentas de taxa sobre o solo e agraciadas por subsídios, e tantos outros. Um relatório recente da União Europeia fazia notar que em Portugal as rendas imerecidas são responsáveis 34% do preço normal do cabaz habitação- comunicações-transportes-alimentação consumido pelos cidadãos. Ou seja, 34% das nossas despesas são gastas a suportar agentes que não produzem qualquer bem nem prestam qualquer serviço."

**'o que é de direito?'

Sem comentários: