Está mesmo na massa do sangue sermos assim. Com o que se está a passar nos meandros da Política, mais propriamente com os problemas na Autarquia da Capital (o seu Presidente até está hoje no estrangeiro), com os partidos todos a quererem ir a votos para tomarem conta de uma casa falida, ... a falta de compromisso dos Homens-políticos, ... o que comentam os portugueses quando são questionados... bem...! Hoje foi o dia do debate mensal na Assembleia da República. Paulo Portas voltou, à cabeça do seu partido e estava tão feliz no seu discurso, que bastava ouvi-lo para o sentir. O seu aviso ao Governo foi para a INDEPENDÊNCIA DA TELEVISÃO (TVI). Já Francisco Louçã estava sarcástico quando afirmou que o Político português vê um porco no campo e pensa logo nos dois presuntos... E o Primeiro Ministro, bem, "oh senhor deputado" com a sua voz característica, é o que melhor me lembro.
Tenho um texto guardado há uns tempos, sobre o Zé Povinho, publicado em Notícias Magazine do dia 12 de Junho de 2005. A entrevista é com o historiador e escritor João Medina. Encontrei-o e vou deixá-lo aqui.
“... se Zé Povinho deixou de ser um retrato sociológico realista e verídico – era-o em 1875 e foi-o até meados do século XX - , a verdade é que continua a ser um retrato psicológico, e esse é o lado fascinante. Não nos reconhecemos naquela cara de barba rala e pele curtida, não usamos colete de camponês nem calças de fazenda de má qualidade, mas, por dentro, do ponto de vista psicológico e anímico, o retrato continua a ser verdadeiro, como retrato do nosso modo de ser. Ou seja, já não somos labregos e rústicos como o velho Zé do derradeiro quartel de oitocentos, vivemos sobretudo nas cidades e nos subúrbios, mas o nosso temperamento e personalidade básica continuam a ser os do estereótipo criado há 130 anos por Bordalo Pinheiro. "“ No aspecto moral do Zé estão uma série de coisas que representam uma certa perenidade do modo de ser português: a apatia, o desinteresse, a inércia, o terrível conformismo moral e cívico, o espírito timorato, arredio ao cogito, o pouco interesse na participação na vida pública, a falta de uma cidadania activa e vigilante, a falta de cultura e de verdadeira educação ou escolaridade, já que o Zé Povinho sabe ler, mas lê muito pouco, para não dizer que não lê nada. Enfim, o Zé não é um homem que se aliste em causas sociais, nas ONGs e outras causas de serviço humanitário. Somos um dos países mais apáticos e menos atreitos a defender causas sociais e humanitárias “
“O Zé Povinho é um homem que tem horror à utopia. A utopia é um risco, é um dos mais interessantes, fascinantes e perigosos jogos intelectuais – foi concebida por um inglês, Thomas More, que foi decapitado pelo seu rei. E o que é a utopia? É a capacidade de transformar um real concreto e dizer que o mundo existente não é o mundo verdadeiro porque há uma felicidade a construir (...) Não digo que o português seja cobarde, politicamente, mas é conformista. Um homem que tem as mãos nos bolsos, como tem o Zé Povinho, aceita tudo, porque ter as mãos nos bolsos é não agir, é pactuar com tudo e com todos, sejam “bufos” da PIDE ou familiares do Santo Ofício. (...) O sorriso, em Portugal, ou é sarcástico, agressivo, vitriólico, sulfúrico – ou é de uma infinita tristeza, mas a tristeza dos vencidos e desistentes. No Zé Povinho há muito de vencido“
“Continuamos a ter comportamentos rudes, agrestes, deseducados e incapazes de verdadeira caridade e generosidade humana. Alguém definia o português como “um homem que conduz o seu carro como um ladrão de automóveis”! Não respeitamos os outros porque nem temos sequer respeito por nós próprios! Esta falta de civismo total é bem a medida da nova burguesia urbana e suburbana“
“O Zé é duplo: por um lado, é de um grande cepticismo; por outro, está sempre à espera da sorte grande que lhe resolva a situação”
“ O português vive permanentemente num estado maníaco-depressivo. Precisa muito do milagre para compensar a falta do normal, do viável. Miguel de Unamuno dizia: se o português acredita no Dom Sebastião, é porque “não acredita” verdadeiramente, ou seja, porque não tem verdadeira fé. (...) Estamos sempre à espera de que solução dos nossos problemas não venha de uma construção colectiva, mas de qualquer coisa de absurdo e de irregular, de explosivo e de inesperado, do milagre, em suma.“
“ A nossa flácida democracia tem funcionado, o que já é prodigioso “
“ (O manguito) é um gesto mágico. Significa um gesto “não” obsceno, linguagem gestual. O que o Zé Povinho está a dizer é isso: eu não quero a albarda, não quero o fisco, não quero o imposto, não quero os sacrifícios que o governo me quer agora impor. Mas porquê? Porque não é um homem dotado de palavra, não tem educação nem letras, não foi educado para usar do dom da palavra, e por isso se exprime através de uma linguagem gestual brutal.“
“ O Zé Povinho não tem sentido de introspecção, de auto-análise. Ele é um homem sem metafísica nenhuma.”
“A vingança, o ódio, o ressentimento azedo e bilioso não são próprios do Zé, nem dos que fizeram ou desenharam o Zé. Porquê? Porque ele não é algoz, é mais facilmente vítima do que carrasco. O Zé não tem vocação para ser carrasco.“
“O Zé Povinho precisa de crescer, de se educar, de se cultivar. Precisaria de mais liberdade, de mais auto-domínio e, sobretudo, de um regime francamente democrático; isto é, feito por ele, e não por salvadores nem por inimigos dele.“
“Enquanto formos Povinho, nunca seremos Povo“
Como lamento não conseguir "escrever" o que me vai na alma, como João Medina o fez, nestas frases, nestes parágrafos.
Zé Povinho precisa de Milagre
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2 comentários:
Olá Guidinhavai ao meu blog que tenho lá uma surpresa para ti
bjs da guida
Olá! Me chamo Samira e sou de Moçambique. Achei muito interessante o Zé Povinho, porque é a maioria de nós: conformistas. Temos de começar a evoluir como seres humanos, intencionalmente, sem violência. Um forte abraço!
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