Antes de chegarmos ao sítio do almoço, forçosamente passamos por Mafra. Tem crescido e a vila está a ficar igual a qualquer outra do mesmo género: casas baixas, com bancos implantados nos rés-do-chão, porta sim, porta sim. E uma loja de chineses, para ser moderna como a Capital. Vale pela diferença este imponente edifício de pedra, que tem o nome de Convento de Mafra. Ler aqui a sua história!.
O que esta postagem de fotos foi buscar aos meandros do meu cérebro. Vou escrevendo. Das coisas que não se esquecem porque foram vividas.
O Calhau, como lhe chama Marido. Esteve durante o serviço militar no Quartel mesmo ao lado, a Escola Prática de Infantaria. Desde Junho de 71 a Junho de 74. Jurou Bandeira aqui. Ainda me lembro de apanhar uma camioneta, como noiva que já era, e com a minha futura-presente sogrinha e cunhado mais jovem, assistirmos ao juramento de bandeira daqueles rpazes, que estiveram a ser preparados para uma guerra. Nossa, no Ultramar. Iria para a Guiné, não iria ... Os nossos receios tinham fundamento, mas felizmente não tiveram futuro. Porque houve uma Revolução. Também me recordo que os banhos para o nosso casamento correram lá.
Onde é que ele estava em Abril de 74? Lá. Ao lado do Calhau. E no dia 25 (penso que nesse dia) vieram por aí abaixo até Lisboa, o pelotão dele e mais 2, dentro de *Berliets*. Estiveram parados na Malveira, perto da 02:00h da manhã. Só quando os mandaram arrancar para Lisboa, souberam que havia uma Revolução. Assentarem arraiais no Quartel General, em S. Sebastião da Pedreira. Eu e a sua família só o vimos durante uma *fuga* que ele fez, para nos dizer que estava tudo bem. Magro, com a barba de dias, dentro de duas fardas - que o frio nesses anos sentia-se mesmo na Primavera - abraçou-se a nós ... ainda me lembro de seu cheiro. Céus, há quantos anos.
Outros tempos, tão diferentes, tão distantes. E as diferenças, tantas, dentro de uma mesma geração. Incrível quando penso nisto.
Desde 1974 até hoje, 2008, tantas mudanças e nada de novo entre nós. Só a guerra acabara para os nossos jovens-homens-obrigados-não-voluntários e mais tarde para os Povos dos territórios que ocupavamos, como sendo nossos. Ainda se continua a combater cá pela Paz, Pão, Habitação, Saúde, Educação ... Só haverá liberdade a sério quando tudo isto deixar de ser motivo de abertura de telejornal.
Hoje, alguns dos jovens-homens-são-voluntários para as guerras de outros povos. Pagos, a bom dinheiro. Penso. Para poderem comprar uma casa, um carro de marca ... com sorte voltarão com vida. Vão haver sempre guerras. O homem é um animal guerreiro! Vão haver sempre homens dispostos a pegar em armas, matar ou combater ... em nome do dinheiro.
Quando olho para o Calhau é sempre com os olhos da jovem de 20 anos que já fui. A cor do Calhau mudou, lavaram-lhe as paredes. Os Carrilhões estão a funcionar e muito bem. A lembrança da tropa do Marido naquela vila está associada e vai continuar a visitar-me, sempre que eu o olhar, mesmo ao longe. Pensarei: Foi ali que ele se fez tropa. Mas nunca chegou a exercer essa profissão. Graças ao 25 de Abril de 1974.
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